terça-feira, 29 de julho de 2025

Quebrar o feitiço da Modernidade e das narrativas do fim do mundo

Nota prévia: este post inspira-se e amplia um texto que escrevi para o blog do festival Pedras’25 (aqui)

Vivemos entre ruínas - não apenas ecológicas, mas também políticas, epistémicas e sensoriais. Não é novidade afirmar que o mundo está em colapso ou que se aproxima o fim do mundo. O que importaria agora perguntar é: que mundo é esse que está a acabar, e para quem? E sobretudo: que mundos podem ainda ser cultivados a partir das suas cinzas?

É precisamente este o ponto de partida de Há mundo por vir? Ensaio sobre os medos e os fins, livro do casal brasileiro Déborah Danowski (filósofa) e Eduardo Viveiros de Castro (antropólogo) publicado em Portugal em 2023 (ver aqui), mas que teve a sua 1ª edição no Brasil em 2014. Contra a ideia de um apocalipse genérico ou natural, impulsionado por um colapso climático/ambiental ou por um conflito nuclear, os autores afirmam que o que colapsa é um mundo específico — o mundo da Modernidade ocidental, sustentado na separação entre Natureza e Cultura, na aceleração capitalista e na fantasia da universalidade. Esse mundo, ao impor-se como único, condenou outros mundos a desaparecerem. Mas na sua queda, talvez se abram brechas. Nas palavras dos autores: “o fim do mundo já aconteceu para muitos povos; o desafio agora é aprender com quem soube sobreviver ao fim.”


O livro parte da premissa de que o apocalipse já não é um evento futuro ou distante, mas o início de uma nova realidade - o fim do “mundo” como modo-de-vida moderno, marcado pelos valores dualistas, produtivistas, extractivistas e capitalistas. Os autores exploram como esse espectro/medo se manifesta na cultura contemporânea (em particular, no cinema) e no discurso filosófico (citando autores como Dipesh Chakrabarty, Gunther Anders, Bruno Latour ou Isabelle Stengers), não como a destruição total, mas como o colapso do paradigma dominante. Denunciam a cosmopolítica moderna antropocêntrica, sustentada na ideia de que a história é uma trajetória linear rumo à dominação da natureza pela ciência e tecnologia, ou seja, pelo engenho humano. Constatam que esse projeto se voltou contra si próprio, resultando no Antropoceno: uma época em que a Terra/Gaia reage violentamente e uma certa ‘humanidade’ se torna uma força geológica. Danowski e Viveiros de Castro questionam que mundo é esse afinal que estaria a acabar - e para quem. Defendem que o mundo que está a acabar não é “o planeta Terra” enquanto realidade física, nem tampouco “o mundo” no sentido de “todos os mundos possíveis”. O que se encontra em crise terminal é um mundo específico, o “mundo moderno” ocidental, capitalista, antropocêntrico - ou seja, o projeto civilizatório que se autodenomina “universal”, mas que foi historicamente construído sobre a exclusão, o extrativismo e a destruição de outros mundos.


Esta visão tem evidentes paralelismos com a que Vanessa Machado de Oliveira apresenta em “Hospicing Modernity” (2021) e à qual me referi num post anterior. O mundo da Modernidade é caracterizado: (i) pela separação entre Natureza e Cultura, uma dicotomia que fundamenta a ciência moderna, a política liberal e a economia capitalista; (ii) pela ideia de progresso linear, uma flecha temporal que levaria da ignorância à razão, da barbárie à civilização, da subsistência à abundância técnica; e (iii) pelo domínio da humanidade sobre a Terra, que culmina no Antropoceno, onde a acção humana altera irreversivelmente os sistemas terrestres. Assim, o que “acaba” é esta ontologia moderna, esta forma hegemónica de organizar o real - que já não consegue sustentar-se nem fisicamente (pela crise ambiental), nem simbolicamente (pela perda de legitimidade), nem politicamente (pela sua incapacidade de responder aos colapsos que ela mesma gerou).

Mas para quem é que o mundo acaba, afinal? Esta é outra das perguntas a que o livro tenta responder. Danowski e Viveiros de Castro propõem que o fim do mundo não é um evento igual para todos, porque nem todos viveram no mesmo mundo - nem tiveram o privilégio de acreditar na sua universalidade. Para muitos povos indígenas, afrodescendentes, camponeses e habitantes de territórios colonizados, o “fim do mundo” já aconteceu - e mais do que uma vez. A chegada dos colonizadores, a escravatura, o genocídio, o roubo da terra e da autonomia foram catástrofes tão absolutas que, para essas populações, o colapso não é uma ameaça futura, mas uma experiência histórica vivida. Inspirados por cosmologias indígenas, em especial o perspectivismo ameríndio desenvolvido por Viveiros de Castro, os autores contrapõem essas visões ao pensamento ocidental moderno. Nos mundos ameríndios, não há separação entre natureza e cultura, e cada ser humano ou não humano vê-se a si mesmo como humano, mas vê os outros como outros. Essa forma de pensar expressa um modo de existir que nunca perdeu contacto com a Terra-Gaia, e oferece uma possível resiliência pós colapso pelo exemplo de povos que “já perderam seu mundo” desde a colonização.

Portanto, os autores invertem a lógica comum: para os modernos ocidentais, o mundo está “a acabar agora”, mas para os povos subalternizados, o seu mundo já foi destruído há séculos. E para Gaia (a Terra como sistema vivo), o que pode estar a acontecer é uma resposta activa ao abuso contínuo de um sistema predatório. Esta distinção leva a uma crítica radical ao universalismo moderno: não há um mundo único a acabar, mas sim vários mundos coexistentes, alguns dos quais resistem, outros colapsam, e outros tentam nascer. Essa é também a tese da antropóloga cultural canadiana Natasha Myers, a que aludi em posts anteriores – ver p.ex. aqui.

Segundo Danowski e Viveiros de Castro, as perguntas ‘que mundo acaba?’ e ‘para quem?’ conduzem a um descentramento necessário: a crise climática/ambiental não é só um problema técnico ou “humano em geral”, mas uma crise de uma ontologia dominante que já destruiu mundos e agora enfrenta a sua própria obsolescência; e a resistência e o pensamento de povos que sobreviveram ao fim dos seus mundos (como os ameríndios) não devem ser vistos como “primitivos” ou “românticos”, mas como fontes legítimas de conhecimento sobre como viver após o colapso de um mundo.

Para quebrar o feitiço da história única e da universalização ocidental, Danowski e Viveiros de Castro propõem a ideia de que há vários mundos dentro do mundo como ruptura frontal com a narrativa dominante da modernidade ocidental, que pressupõe um só mundo real (natural, objetivo, científico), uma só história (linear, progressiva, eurocêntrica), e um só destino (tecnológico, globalizado, capitalista). Aquele feitiço sustenta-se naquilo que os autores chamam de mitologia moderna, que nega a possibilidade de múltiplos modos de existência válidos. Ao reconhecer que existem cosmologias, ontologias, temporalidades e ecologias diversas, revela-se que o mundo moderno é apenas um entre outros, e não o ápice inevitável da história. Este gesto decolonizador é potente porque abre espaço para vozes e práticas silenciadas: o que os modernos vêem como “mito” ou “tradição” pode ser, afinal, teoria cosmológica, política ambiental e resistência epistémica.

A constatação da existência de vários mundos não é um relativismo passivo, mas um ponto de partida para uma cosmopolítica activa. Isto significa não só recusar o monopólio ocidental sobre o real e o possível, mas trazer para o centro da política os modos de existência que persistiram apesar da colonização. Os autores defendem que a experiência histórica de povos que já passaram pelo fim dos seus mundos pode ser uma chave política para os tempos de colapso actuais. Estes povos sobreviveram não apenas biologicamente, mas ontologicamente — mantiveram vivas relações, saberes e modos de habitar que escapam à lógica moderna.

Além disso, o reconhecimento de múltiplos mundos obriga a abandonar o projeto totalizante de uma política universal (moderna, estatal, hierárquica) e pensar em termos de alianças trans-ontológicas, onde diferentes formas de vida se articulam sem precisarem de ser reduzidas a uma só norma. Pensar politicamente outros caminhos passa assim por escutar e aprender com mundos que não colapsaram com a modernidade, e por reimaginar a política como um espaço de negociação entre ontologias.


Uma das autoras citadas por Danowski e Viveiros de Castro é a filósofa belga Isabelle Stengers que propõe o conceito de “abrandamento” (ralentissement) como estratégia de resistência ao tempo acelerado e predatório do capitalismo global (que Stengers apelida como “a barbárie que vem”). Esse ritmo imposto — do lucro, da extração, da urgência tecnocrática — é também o ritmo da barbárie: um tempo que não permite pensar, escutar, hesitar, cuidar. O abrandamento cosmopolítico é, segundo Stengers, uma forma de deter o gesto imperial da solução imediata e totalizante, uma estratégia para criar espaços de respiração para os mundos em perigo e uma ética da atenção, que não responde com pressa, mas com escuta e co-presença às situações concretas e às vozes silenciadas. Stengers propõe resistir não com “grandes narrativas”, mas com pequenas práticas de recusa e criação — alianças entre mundos que não se deixam reduzir a um só. Este abrandamento é também cosmopolítico, porque reconhece a multiplicidade de agentes (humanos e não humanos), aceita que nenhum saber tem a totalidade da resposta, e exige modos de convivência que não passem pela eliminação da diferença.


Outro autor invocado por Danowski e Viveiros de Castro é o líder indígena Ailton Krenak, que propõe uma reviravolta potente na ideia de futuro, não como um salto em direção a algo novo e inédito, mas um reencantamento com aquilo que já lá estava — e foi ignorado, destruído ou esquecido. O futuro ancestral seria um futuro enraizado nos modos de vida e pensamento dos povos originários, um retorno à terra, não como nostalgia, mas como reactualização da sabedoria que permite existir em relação, e uma recusa da ideia de que o “futuro bom” depende do progresso técnico e da acumulação - ver também aqui. Para Krenak, a Terra é viva, os rios sonham, e os humanos são apenas parte de uma rede ampla de existência. O futuro que vale a pena viver é aquele que não separa o que vive do que pensa, o que sente do que produz, e que honra os laços com quem veio antes e com quem virá depois — humanos e não humanos. Tal como Danowski e Viveiros de Castro, Krenak vê que o mundo moderno acabou, mas não o mundo dos que sabem dançar com o tempo, com os ciclos, com a floresta, com a água.

Quer Stengers, quer Krenak, propõem uma ruptura com o tempo moderno: Stengers, através da recusa da aceleração e da tecnossolução imperial; Krenak, através do enraizamento num tempo ancestral que não é passado, mas possibilidade futura. Ambos recusam o apocalipse como fim total e propõem formas de resistência sensível, não heroica, de reencantamento do mundo, sem cair em romantismo, e de politização da coexistência com a Terra, em vez da guerra contra ela.


Na perspectiva de pensar e cocriar outros mundos dentro do mundo, volto a invocar Natasha Myers, que nos convida a reaprender a cultivar mundos habitáveis. No seu ensaio How to Grow Livable Worlds, Myers propõe uma viragem botânica e sensorial: em vez de salvar “o planeta” como abstração, devemos envolver-nos concretamente com os seres e territórios com quem coabitamos, em particular com as plantas. Cultivar mundos é um acto de atenção, de escuta, de co-criação — um gesto quotidiano de resistência ao esvaziamento relacional promovido pela ontologia moderna.

Para Myers, o saber que interessa não está nos satélites nem nas megateorias, mas nos gestos subtis de cuidado e interdependência que ainda se praticam em jardins urbanos, hortas comunitárias, florestas protegidas, rituais indígenas, danças com as árvores. É a partir desses microcosmos que se pode reactivar o nosso sensório vegetal e ecológico — adormecido pelo modo como o Ocidente aprendeu a ver o mundo como recurso, e não como relação. A ecologia, aqui, deixa de ser gestão de populações e ecossistemas, e passa a ser arte de coexistência.

Talvez a Modernidade tenha sido, como sugere Natasha Myers, um feitiço lançado sobre o mundo — um encantamento sombrio que nos ensinou a ver a Terra como objeto, o tempo como linha, o outro como primitivo. Um feitiço que nos separou do que éramos: floresta, rio, bicho, sonho. Agora, entre escombros e auroras, cabe-nos tecer outro encantamento, um contra-feitiço que dissipe a névoa da separação e devolva espessura ao viver. Precisamos, como diz Stengers, de um abrandamento, para que os mundos silenciados possam voltar a falar — “com hesitação, sem arrogância, na presença dos outros.” Precisamos, como propõe Krenak, de um futuro com raízes, onde “não sejamos os órfãos da Terra”. Precisamos de ‘hospedar’ o fim com compaixão e compostagem, como defende Vanessa Machado de Oliveira, e deixar morrer o que já morreu — a promessa do progresso sem mundo. E então, talvez, possamos ouvir as plantas sonhar, sentir o chão respirar, cultivar mundos com gestos pequenos, lançar encantamentos de cuidado, escuta e relação. Porque, como lembram Danowski e Viveiros de Castro, “há mundo por vir”, sim — mas ele não virá como um novo império e não será o mesmo para todos. Virá como o retorno de algo que nunca partiu, esperando que finalmente o vislumbremos.

Aceito, por fim, o desafio de Natasha Myers de quebrar o feitiço que nos foi lançado pela Modernidade, convocando os pensamentos e os mundos que resistem (reexistem) dentro do mundo, lançando este outro (que entretece todas as vozes que citei):

Feitiço para desfazer o mundo inabitável

Dizem que o fim do mundo está próximo.
Mas que mundo é esse? — E de quem?

Talvez o mundo que está a acabar
seja um feitiço.

Um feitiço lançado pela Modernidade,
um feitiço que nos cegou para o vivo,
que fez do rio um canal, da floresta um recurso,
do tempo uma flecha,
do outro um primitivo.

Esse feitiço ensinou-nos
a esquecer que somos terranos – da Terra, do Húmus.
Que somos relação.
Que somos sonho.

Agora, entre os escombros do progresso,
Saibamos dizer:
não tenham pressa, nem acelerem - abrandem.

Abrandem para escutar os mundos
que ainda falam baixinho,
nas margens, nas rochas, nos corpos que resistem.

Relembremos:
o futuro não está à frente — está sempre ao nosso lado.

O futuro vem dos ancestrais,
vem dos que ainda dançam com os ciclos,
dos que sonham com o rio.

Afirmemos sem hesitar:
não tentem salvar o que já morreu (ou está moribundo).

Deixemos morrer a modernidade com lucidez e gentileza.
E acompanhemo-la com dignidade,
sem a ilusão de que fomos inocentes.

Aceitemos por fim que
há mundo por vir, sim — mas ele não é para todos o mesmo.
Ele não será um novo império.
Será um novo encantamento.

Por isso, talvez seja hora de lançarmos outro feitiço.
Um contra-feitiço.
Um desencantamento do desencantamento.

Com filamentos rizomáticos.
Com escuta.
Com compostagem.

Com mundos por (de)vir,
que não nos pertencem —
mas que nos esperam.

Saibamos evocá-los e nutri-los - simpoieticamente, amorosamente…

domingo, 6 de julho de 2025

Pseudoceno – Adenda com referências adicionais

Nota: este post é uma adenda ao post anterior.

Julian Assange, numa declaração em 2011 que citei no meu post de Março de 2024, afirmou que “os jornalistas são criminosos de guerra”. Esta afirmação pode parecer desnecessariamente categórica, simplista e até injusta, e terá muito possivelmente sido um dos motivos que levou muitos media ocidentais a criticá-lo ou até a abandoná-lo desde então. Mas Assange estava a falar numa acção de protesto contra a fabricação de ‘guerras justas’ pelo Ocidente, em particular as guerras no Afeganistão e Iraque, e usou aquela afirmação como resposta a uma pergunta que ele próprio colocou sobre a cumplicidade dos media: “Quando compreendemos que as guerras surgem como resultado de mentiras espalhadas ao público britânico, ao público americano e ao público de toda a Europa e de outros países, então quem são os criminosos de guerra?

Em relação ao meu post mais recente, quero clarificar dois aspectos. Em primeiro lugar, critiquei os media dominantes ocidentais, mas nada disse sobre o que publicaram os media no Irão ou noutros países que puseram em causa a narrativa do Ocidente. A minha escolha foi premeditada e não se destina a branquear a manipulação e demagogia que também é feita em alguns desses media. É sabido que muitos são controlados ou censurados pelos governos autocráticos desses países e não é de espantar que distorçam a narrativa de modo a satisfazer a agenda dominante. Escolhi focar-me nos media dominantes ocidentais, porque nesta parte do mundo e cultura em que me insiro se apregoa que existe liberdade de informação e que os media são isentos e transmitem a verdade dos factos. Ora acontece que isso simplesmente não corresponde à realidade. Pior ainda, o conteúdo e a forma como as notícias são dadas pretendem legitimar uma agenda belicista ou um dos lados beligerantes, suprimindo ou distorcendo os factos, ou apresentando uma versão enviesada desses factos.

Em segundo lugar e para além das referências que já tinha inserido no post sobre o Pseudoceno, acrescento agora mais alguns links para vídeos e artigos que lançam críticas fundamentadas aos media ocidentais dominantes pelo viés favorável a Israel na sua cobertura, não só do conflito mais recente entre Israel e o Irão, mas também do massacre dos palestinianos em Gaza e na Cisjordânia, desde 2023 (ver p.ex. aqui). O primeiro vídeo da Aljazeera, com depoimentos da historiadora iraniano-americana Assal Rad, especialista no Médio Oriente, foca-se no conteúdo de títulos e resumos das notícias, que são muitas vezes da responsabilidade das redacções editoriais e não necessariamente dos jornalistas que escrevem os artigos – ver aqui. Rad tem vindo a fazer o exercício de corrigir os títulos de modo a reflectir a realidade que alegam descrever - ver aqui. Num artigo de opinião recente, o académico de ciência política Ali Abootalebi critica e desconstrói os mitos veiculados por media internacionais como a BBC e a Reuters sobre o Irão. Já o editor do site Countercurrents, Binu Matthew, alerta para o desvio de atenção dos media ocidentais em relação aos continuados massacres em Gaza perpetrados por Israel, causado pelo conflito entre Israel e o Irão - aqui.

Os restantes vídeos referem-se a análises das decisões editoriais recentes da BBC sobre artigos ou reportagens publicados no seu site relativos ao que se passa em Gaza deste 2023, cujo conteúdo foi distorcido a favor de Israel, ou sobre a supressão de narrativas desfavoráveis:

- comentário e discussão sobre relatório do Center for Media Monitoring (BBC On Gaza-Israel: One Story, Double Standards) que revela a dimensão do viés favorável a Israel na cobertura noticiosa da BBC do conflito em Gaza (Owen Jones): https://youtu.be/052e22XabME  

- comentário à decisão da BBC de não exibir o documentário “Gaza: medics under fire”* que havia sido encomendado pela própria BBC sobre o trabalho das equipas médicas em Gaza e que lhe valeram acusações de ‘censura política’ (Novara Media): https://youtu.be/2PWDEykH944

- comentário sobre conteúdo do site da BBC que suprime informação disponível sobre o arsenal nuclear de Israel (Novara Media): https://youtu.be/JxEAsd_fR-I - ver também aqui.

Em relação às sucessivas incorreções e distorções por parte da BBC, foi divulgada uma carta aberta subscrita por mais de 300 personalidades mediáticas britânicas, incluindo mais de 100 jornalistas da própria BBC, a denunciar a situação e a acusar a BBC de forçar os seus jornalistas a fazer propaganda pró-Israel - ver aqui ou aqui. A propósito do conteúdo desta carta aberta, recomendo ainda artigo de opinião escrito pela ex-jornalista da BBC, Karishma Patel.


* O documentário está agora disponível sob o nome “Gaza:doctors under attack” através dos sites do Channel 4 ou da Zeteo (requerem subscrição).

sábado, 28 de junho de 2025

Pseudoceno: a Era da Mentira - Como Israel e os EUA fabricaram uma nova Guerra Justa

“Ao nível mais vasto das sociedades, ou melhor, de segmentos dessas sociedades, aquelas que lideram pela agressão a outros, culminando em guerras, estão frequentemente envolvidas na disseminação de falsidades e auto-enganos, sendo os meios de comunicação e os sistemas educativos dois canais comummente utilizados.” (“At the level of wider societies or rather wider society segments, those which lead by aggression towards others, culminating in wars, are often involved in spreading falsehoods and self-delusions, media and education systems being two commonly used channels.”) Bharat Dogra (daqui)

“Existem inúmeros mitos comuns que sustentam a guerra. Desmascarar esses mitos e, assim, mudar as crenças fundamentais das pessoas sobre a guerra e a paz é uma forma poderosa de eliminar o potencial para a guerra.” (“There are numerous commonly believed myths underpinning war. Debunking these myths, and in so doing changing peoples’ fundamental beliefs about war and peace is a powerful way to remove the potential for war.”) Taylor O’Connor (daqui)

Vivemos um tempo perigoso, em que a mentira já não precisa de se esconder. Já não se mascara de meias-verdades, nem se esforça por parecer plausível. Ela ocupa agora o centro da cena, altiva, amplificada pelos media e tolerada – ou pior, legitimada – por uma cidadania entorpecida pela sobrecarga informativa e pelo descrédito acumulado das instituições governativas. Bem vindos ao Pseudoceno* – a era da mentira. Tal como o Antropoceno enfatiza o impacto humano sobre a Terra, o Pseudoceno marca a colonização da realidade pela falsidade. É uma época em que a mentira já não é desvio ou acidente, mas fundação e estratégia. Já tinha anteriormente denunciado o recurso à mentira no contexto de diversos conflitos e invasões protagonizadas pelos EUA e os seus aliados ocidentais, enfatizando o papel dos media na fabricação do consentimento para a guerra - aqui e aqui. Elogiei também quem se atreve a revelar e a denunciar as verdades que os poderosos querem escamotear ou esconder - aqui e aqui. O meu foco vira-se agora para a nova escalada militar no Médio Oriente, instigada por Israel e os EUA, com o conluio dos seus ‘Aliados’ europeus, e para as narrativas falaciosas que validam o belicismo e a geopolítica militarista em detrimento da diplomacia, da coexistência pacífica e da paz.

Mentiras descaradas, falácias e logros, desonestidade intelectual, hipocrisia – tem sido este o espectáculo diário proporcionado por muitos media, que reproduzem as sucessivas declarações dos ‘líderes’ políticos de Israel, dos EUA, da União Europeia ou de diversos países europeus, sobre os acontecimentos recentes no Médio Oriente, em particular o ataque militar não provocado de Israel ao Irão, iniciado a 13 de Junho. À parte algumas análises de comentadores ou artigos de opinião (ver p.ex. aqui, aqui ou aqui), as narrativas que surgem nos media convencionais parecem saídas de um guião onde se repetem as mesmas palavras de ordem – “conter a iminente ameaça nuclear iraniana”, “Israel tem direito à auto-defesa”, “é preciso contenção e diplomacia” – ver p.ex. aqui ou aqui. Caricaturando o Irão como o mal absoluto no contexto da ‘guerra justa’ contra a ameaça islâmica, aquelas narrativas escamoteiam a ilegalidade da agressão israelita e viram a lógica do avesso tentando legitimá-la como ataque preventivo (ver p.ex. artigos de opinião em media nacionais: aqui ou aqui). Mais gritante ainda é a hipocrisia e a duplicidade de critérios (‘double standards’) dos países ocidentais que, como se lembrarão, se apressaram a condenar veementemente a invasão da Ucrânia pela Rússia em 2022 e o ataque do Hamas a Israel em 2023, classificando-os de agressões militares não provocadas (‘unprovoked’) e como violações do direito internacional, mas abstêm-se despudoradamente de aplicar a mesma argumentação à recente ofensiva não provocada de Israel contra um país soberano – ver p.ex. aqui. Para cúmulo, apelam agora à diplomacia e à contenção de Israel e do Irão, o que têm recusado sistematicamente em relação ao conflito entre a Rússia e a Ucrânia – ver p.ex. aqui.


A ofensiva militar de Israel contra o Irão, agora secundada abertamente pelos Estados Unidos, é apenas o mais recente episódio de uma política internacional que se divorciou da verdade factual e nos empurra para um conflito mais alargado e para a barbárie, onde a diplomacia foi eclipsada por um belicismo sem freios. As justificações apresentadas pelos dirigentes israelitas e americanos para esta acção – sustentadas em alegações de “defesa legítima”, “prevenção estratégica” ou “resposta proporcional” – constituem um exercício de manipulação retórica que desafia frontalmente a lógica, o direito internacional e a ética. Estas falácias foram devidamente denunciadas e desmontadas por outros – ver aqui, aqui ou aqui e ainda dossier do esquerda.net.

Resumidamente, o ataque ocorreu dois dias antes da ronda final de negociações diplomáticas entre os EUA e o Irão, constituindo uma tentativa clara de sabotar a via diplomática; nenhum relatório da AIEA (Agência Internacional de Energia Atómica) confirmou a existência de um plano iraniano para fabricar armas nucleares a curto prazo; Netanyahu utiliza o argumento do “perigo nuclear iminente” há mais de uma década, em particular no célebre discurso na ONU em 2012, já então sem apresentar provas concretas; um ataque preventivo sem existir uma ameaça iminente é ilegal à luz do direito internacional. Mais grave ainda é o facto, frequentemente escamoteado, de que Israel é, muito provavelmente, uma potência nuclear. Possuirá um arsenal estimado entre 80 e 200 ogivas, mantém uma política de “ambiguidade deliberada” e nunca assinou o Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP). O Irão, por outro lado, é signatário do TNP e sujeito a inspecções regulares. Esta assimetria brutal é sistematicamente omitida do debate público.


Uma questão central é que a mentira e as narrativas falsas ou parciais são também uma forma de ocultar a verdade – neste caso, as reais intenções ou interesses geoestratégicos do envolvimento dos EUA na ofensiva contra o Irão, cujo objectivo (não explicitado ou dissimulado) é afinal manter a todo o custo a sua hegemonia mundial – ver aqui ou aqui.

Igualmente inquietante, porém, não é apenas a agressividade das acções ou a duplicidade das palavras. É o facto das narrativas falaciosas serem imediatamente recicladas por grande parte dos meios de comunicação ocidentais como verdades operacionais – ver p.ex. aqui. As manchetes não interrogam; reproduzem. Os comentadores não contextualizam; repetem. A opinião pública, exausta e desorientada, assiste a esta encenação com uma mistura de cepticismo e impotência (ver p.ex. este Bartoon). E a verdade permanece oculta.

Estamos a assistir à normalização da desinformação como instrumento de governação e de geopolítica, feita pelos mesmos que afirmam opor-se à desinformação – mas apenas quando é usada pelos seus adversários. Quando um líder afirma sem pudor que um ataque preventivo é “um acto de paz”, ou que o apoio militar a um bombardeamento em larga escala é “um compromisso com a estabilidade regional”, já não estamos apenas diante de uma divergência política (ver aqui). Estamos perante a corrosão deliberada da linguagem e da consciência coletiva – como uma Novilíngua orwelliana.


Este fenómeno não é novo (ver p.ex. aqui), mas o que mudou é o grau de aceitação. A mentira institucionalizada passou a ser tolerada como parte do jogo geopolítico – bastaria lembrar as alegadas ‘armas de destruição massiça’ que serviram de pretexto à invasão do Iraque em 2003 (ver p.ex. aqui) ou a ‘Guerra ao Terror’ como justificação para a invasão do Afeganistão em 2001, então apelidada de ‘Guerra Justa’ (ver p.ex. aqui). O que é ainda pior é que a mentira é celebrada por alguns como demonstração de “realismo” ou “coragem estratégica”. Como se o cinismo fosse a única bússola possível num mundo em declínio.

Mas a minha revolta não se dirige apenas a Washington ou Telavive. Ela dirige-se também a Bruxelas, Berlim, Paris, Lisboa — aos dirigentes da UE e governos europeus que, em vez de questionarem a escalada, se limitaram a alinhar o seu discurso com as justificações falaciosas de Israel e dos EUA, prolongando assim a sua cumplicidade com a violência e destruição promovidas pelo governo fundamentalista e criminoso de Netanyahu, incluindo o genocídio em Gaza – ver p.ex. aqui ou aqui. É igualmente chocante constatar como os dirigentes europeus se alinham mecanicamente com os ditames da máquina militar e discursiva da Aliança Atlântica, como aconteceu na recente cimeira da NATO em Haia – ver p.ex. aqui ou aqui. Aderiram cobardemente às chantagens do presidente americano – que ainda há poucos meses apelidavam de ameaça para a democracia! – cedendo ao aumento de gastos militares, que irá beneficiar a indústria de armamento do outro lado do Atlântico. O tom de submissão e bajulação perante Trump foi vergonhosamente notório numa mensagem pessoal que o actual SG da NATO, Mark Rutte, lhe enviou na véspera da cimeira em Haia, onde afirmou (ver p.ex. aqui): “Felicitações e agradecimentos pela sua acção decisiva no Irão, foi algo verdadeiramente extraordinário e algo que ninguém jamais ousaria fazer. Fez com que estejamos todos mais seguros.” Perante garantias de comprometimento com gastos militares equivalentes a 5% do PIB, Rutte acrescentou: “Conseguirá o que NENHUM outro presidente conseguiu fazer em décadas. A Europa vai pagar-lhe em GRANDE, como deve, e essa será a sua vitória”. É o nível mais baixo da vassalagem ao poder imperial americano por parte de um dirigente europeu. É caso para perguntar onde está a dignidade das elites políticas europeias? Onde estão afinal os valores humanistas da Europa? Onde ficou a memória histórica que deveria vacinar-nos contra o belicismo e a repetição dos erros do século XX? Onde estão os estadistas capazes de dizer “não” perante a chantagem política e económica e que recusam o caminho para o abismo da guerra?

Inesperadamente, uma outra verdade sórdida acabou por sair da boca do novo chanceler alemão, Friedrich Merz, que admitiu, sem rodeios, que “Israel está a fazer o nosso ‘trabalho sujo’” (ver aqui). Uma admissão que, apesar da sua crueza, acaba por revelar uma intenção não assumida: os governos ocidentais, incapazes de conter a alegada ameaça do fundamentalismo islâmico personificada pelo Irão, preferem externalizar a agressão, garantindo que os seus interesses são protegidos sem envolvimento militar directo. É uma confissão involuntária — mas reveladora — de um cálculo moral arrepiantemente frio. Não se trata de defesa, nem de segurança internacional. Trata-se de manter a hegemonia a qualquer custo, desde que o sangue derramado não seja “nosso”.


Como português e europeu, inserido numa cultura que promove alegadamente os ideais da concórdia, da justiça, do primado da paz e do direito internacional, recuso-me a aceitar esta adesão tácita ao discurso bélico como se fosse inevitável. Se o caminho escolhido pelos ‘líderes’ for o da guerra, que o digam com clareza — mas saibam que não será em meu nome. E que assumam também o custo ético e humano de cada decisão que tomam em surdina, mascaradas de necessidade ou realismo.

Só que esta nova era do Pseudoceno não é apenas um fenómeno discursivo. As consequências são concretas e devastadoras. Milhões de vidas estão em risco, comunidades inteiras são condenadas ao exílio ou à destruição, o tecido social global é corroído pela desinformação e pela polarização. E, sobretudo, estamos à beira de um retrocesso civilizacional sem precedentes: o colapso da ideia de que o diálogo, a diplomacia e o direito podem prevalecer sobre a força bruta e a destruição.

A retórica belicista encoraja novas mortes, destruição cultural, inúmeros famintos e deslocados. Um mundo que se vangloriava de caminhar para a diplomacia e os direitos humanos, arrisca-se hoje a retroceder para a barbárie global, onde os interesses geopolíticos e da luta pela hegemonia se sobrepõem ao bem estar das populações e ao bem comum.


A par do sofrimento humano e da destruição ambiental e cultural, o que está em risco é o próprio legado de um projecto civilizacional em declínio: o direito internacional, a diplomacia multilateral, a ética da responsabilidade. Aquilo que o mundo ocidental dizia defender — e que agora abandona, de forma cobarde ou calculada. Para que não prevaleça o primado da mentira, tenhamos a coragem e o discernimento de “desconstruir as mentiras que justificam a guerra para nos ajudar a passar da mentira de uma guerra justa para a criação de uma paz justa”, como defende Taylor O’Connor neste artigo cuja leitura recomendo.

* Termo que criei a partir do grego pseudos (mentira, falsidade) e o sufixo -ceno (novo, recente), tal como é usado na terminologia da geologia como Holoceno ou Antropoceno.

sábado, 17 de maio de 2025

Estabilidade: o fetiche do discurso político dominante

Quem reprovou no exame da estabilidade foi a política. Quem vai votar para inventar uma estabilidade qualquer são os portugueses. Na realidade, todas as forças políticas são pela estabilidade mas todas contribuem para a instabilidade ao demitirem-se de pensar politicamente o país.” Carlos Marques de Almeida (daqui)

Vivemos numa era marcada por incertezas: crises económicas recorrentes, alterações climáticas, tensões geopolíticas e rápidas transformações tecnológicas. Neste contexto, é comum ouvir os líderes políticos prometerem estabilidade como um dos pilares centrais das suas propostas. A estabilidade, entendida como uma condição de ordem, segurança e previsibilidade, torna-se um valor particularmente apelativo quando o presente é marcado pela instabilidade. Mas até que ponto essa insistência na estabilidade é realista, eficaz ou mesmo desejável? Nesta reflexão proponho-me analisar as razões pelas quais a estabilidade é valorizada politicamente, os riscos de a tomar como um fim em si mesma, e os desafios que ela enfrenta actualmente em Portugal e na Europa.

Desde a intervenção da troika que sucessivos governos portugueses (e do sul da Europa) – da direita ao centro-esquerda – repetem a ideia de “estabilidade” como condição para o crescimento e a credibilidade externa (ver p.ex. aqui). Ao nível europeu, o discurso é semelhante (ver p.ex. aqui): preservar a zona euro, conter a inflação e, mais recentemente, “dar previsibilidade aos mercados” perante as guerras na Ucrânia e no Médio Oriente. Contudo, a proclamação de estabilidade tem coincidido com uma sucessão de choques políticos: Portugal volta a eleições antecipadas em 2025 depois de mais uma queda de governo (precipitada pelos partidos que se revezam na governação e que defendem a estabilidade governativa!) e o Conselho Europeu passou os últimos dois anos a renegociar – outra vez – as regras orçamentais. A “estabilidade” retórica contrasta assim com a instabilidade real.


Na verdade, ao nível de Portugal, as rendas das casas duplicaram numa década e em Setembro de 2024 milhares saíram à rua em Lisboa e no Porto contra a crise da habitação (ver aqui). Mais de metade dos trabalhadores ganha menos de 1000 €/mês, facto reiterado nas manifestações por aumentos salariais em Novembro de 2024 (ver aqui). Em termos europeus, entre 2015 e 2024 os preços das casas subiram 53% em média na UE (ver aqui); greves e disputas laborais espalharam-se em 2023-24 porque os salários não acompanharam o custo de vida (ver aqui); sondagens pré-eleitorais mostraram o custo de vida e as desigualdades como principal inquietação dos eleitores europeus (ver aqui). Apesar de a Comissão Europeia proclamar sucessos em “coesão social”, o coeficiente de Gini da UE continua estacionado perto dos 30 pontos e a percepção de injustiça fiscal cresceu, abrindo espaço a forças populistas que se apresentam como “anti-sistema”. A estabilidade invocada pelos partidos tradicionais, longe de acalmar o mal-estar, tem sido vista como defesa de um status quo que bloqueia decisões políticas ousadas.

No que se refere à resposta à calamidade ecológica, a UE reduziu emissões 31% face a 1990, mas projeta-se apenas -49% até 2030 – aquém da meta dos -55% (aqui); o Climate Action Tracker classifica o desempenho como “Insuficiente” (aqui). Em Portugal, a seca “permanente e sistémica” no Algarve levou o governo a racionar água e anunciar um pacote de 366 M€ em obras de emergência (aqui), revelando atraso crónico na adaptação. Isto para não falar dos planos sobre a gestão da água com recurso a novas barragens e transvases entre bacias hidrográficas (a estratégia "Água que Une" apresentada pelo governo em Março deste ano), que são uma aberração em termos ambientais (ver p.ex. aqui ou aqui). A narrativa oficial da UE celebra o European Green Deal, mas, perante pressões de agricultores, lobbies industriais e partidos eurocépticos, Bruxelas já suavizou regras sobre pesticidas e veículos de combustão. O conflito entre custo de vida e transição climática expõe a incapacidade de articular justiça social com acção ecológica.

A experiência portuguesa e europeia das últimas décadas revela assim que a estabilidade meramente contabilística não basta. Quando a habitação se torna inalcançável, os salários estagnam e a água escasseia, insistir em “não abanar o barco” é, paradoxalmente, afundá-lo. O desafio político é passar de uma estabilidade defensiva para uma meta-estabilidade transformadora, capaz de combinar medidas de redistribuição justa com medidas de verdadeira sustentabilidade ambiental. Isso exigiria coragem institucional: mudar regras que bloqueiam medidas ousadas, quebrar a captura dos grandes interesses e colocar a participação cidadã no centro das decisões.


Também por cá a palavra estabilidade é recitada como um mantra. Partidos rivais juram ser o garante dessa virtude suprema (ver p.ex. aqui); comentadores repetem-na em todos os painéis; presidentes ou candidatos presidenciais invocam-na sempre que se aproxima ou se vive uma nova crise política (ver p.ex. aqui). Mas basta afastar a cortina do discurso para perceber que a “estabilidade” que nos vendem é, na melhor das hipóteses, um verniz frágil. Os dois episódios que marcaram esta Primavera — o apagão nacional de 28 de Abril e a campanha para as legislativas antecipadas de 18 de Maio — revelam o vazio de um conceito que já não protege quem mais precisa, nem prepara o país para o futuro que nos espera.

Na dia 28 de Abril, grande parte do território continental português foi atingido por um apagão energético súbito, afectando hospitais, redes de transportes, comunicações móveis e serviços digitais. Durante várias horas, não houve qualquer explicação oficial clara (ver p.ex. aqui). Só no dia seguinte o governo reconheceu “uma falha grave na coordenação da rede de distribuição elétrica” ligada a um pico de sobrecarga durante uma operação de manutenção. Este incidente, longe de ser um episódio isolado, é sintoma de uma infraestrutura envelhecida, pouco resiliente e mal preparada para a nova realidade energética (ver p.ex. aqui). Portugal, apesar de ter uma das maiores quotas de renováveis da Europa, não investiu a tempo em sistemas robustos de armazenamento, backup e gestão digital descentralizada. A dependência da rede ibérica, aliada à privatização de setores estratégicos, torna o sistema vulnerável a falhas que se propagam rapidamente (ver p.ex. aqui). O discurso oficial insiste em apresentar a transição energética como “estável” e exemplar. Mas o apagão revelou a fragilidade sistémica por detrás da imagem de modernização, e a ausência de um plano claro de resposta a crises, o que gerou desinformação, pânico localizado e acentuou a desconfiança pública. Estabilidade sem investimento público, sem planeamento de risco e sem soberania sobre infraestruturas críticas, é mera aparência. O apagão revelou ainda fragilidades sistémicas mais profundas que quase não vi afloradas – excepção feita a este artigo de opinião de Ruy Filho, do qual transcrevo alguns excertos: “Ao ficarmos sem luz e muitos também sem acesso à comunicação, isolados no escuro físico e informacional, revelou-se nossa dependência profunda aos meios. Porque passamos a ter os recursos como inesgotáveis e garantidos e, a partir dessa outra qualidade de delírio, definimos, sem perceber, a condição da identidade coletiva atual. (…) Encontrarmos outras formas requer elaborarmos “ficções ativas”, ou seja, imaginarmos outro mundo: um que não seja apenas conduzido por tecnologias com ramificações globais pertencentes a impérios econômicos quase abstratos, de tão amplos e inacessíveis. É preciso pensar pela multiplicidade de saberes, de meios, de maneiras de habitar a realidade disponíveis e tão experimentadas por outras culturas. Um “pluriverso” composto pelos saberes de povos e modelos civilizacionais em consonância à natureza e perspectivas não-capitalistas e não-extrativistas. Precisamos mais uns dos outros e menos dos meios que nos dominam; precisamos desconfiar das facilidades tecnocráticas, enquanto criamos futuros múltiplos, responsáveis e comuns. (…) O apagão pode ter assustado alguns, alertado outros, divertido e até não incomodado quem nada tem para sofrer suas consequências. E pode, se assim quisermos aproveitar a experiência, direcionar nossas sensações ao incômodo por tanta dependência e o quanto essa dependência é dada pelo excesso. Não se sabe ainda agora o que ocorreu. Mas não deixa de ser um confronto entre um sistema em colapso e a natureza.”

© Expresso

Duas semanas depois, arrancou a campanha para as legislativas antecipadas, convocadas na sequência do caso que envolve o primeiro-ministro e que levou à queda do governo da AD. Esse desfecho foi precipitado por manobras dos dois principais partidos (com o conluio dos restantes partidos da AR), que alegaram ambos não querer empurrar o país para novas eleições antecipadas - ver aqui e aqui. No primeiro artigo, Manuel Carvalho escreve: “A crise política que determinou a queda do Governo não é, por isso, tanto consequência de um escândalo no coração de São Bento como prova de que os líderes partidários, em especial Pedro Nuno Santos e Luís Montenegro, perderam toda a capacidade de diálogo e de compromisso. Não foram, nem são, capazes de estabelecer regras ou níveis mínimos de empatia para dirimir conflitos políticos graves e importantes como o actual”; e, no segundo, David Santiago escreve: “PSD e PS tentam passar a ideia de que não querem eleições, mas nenhum está disposto a algo fazer para as evitar. Pelo contrário, estão mesmo dispostos a colocar Portugal numa trajectória de miniciclos governativos só uma vez vista no período democrático”. Naturalmente, o caso que envolve o actual PM foi usado como arma de arremesso na campanha, mas as suspeitas de corrupção que envolveram membros do executivo anterior e levaram à queda do governo de António Costa em 2023, poderiam ter sido uma oportunidade para um debate profundo sobre o modelo de desenvolvimento, a crise ecológica e a crescente desigualdade. Mas não foram! Já o apagão do mês anterior foi praticamente apagado do debate. PS e PSD — ora adversários, ora gémeos siameses da responsabilidade orçamental — desfilaram promessas recicladas: aliviar IRS, baixar IVA da energia, acelerar o PRR. E repetiram os incontornáveis apelos à estabilidade governativa (ver aqui e aqui). Nenhum ousou pôr em causa as regras da zona euro que comprimem o investimento público; nenhum explicou como taxará as rendas excessivas da banca ou travará a escalada do preço das casas. Quando a conversa resvala para a crise climática, surgem chavões vazios: “crescimento verde”, “competitividade sustentável”. É a retórica das metas difusas para 2030 a servir de disfarce à falta de acção no presente.

À esquerda, BE e Livre tentaram introduzir temas como rendimento básico, taxação do património e justiça climática; à direita, IL e Chega 'surfaram' o descontentamento com a carga fiscal e o sistema político. Mas o eixo gravítico do debate manteve-se firme: quem melhor garante “estabilidade” — leia-se, previsibilidade para os mercados, paz social, sem mexer demasiado no tabuleiro? É a política transformada em ginástica de contorcionismo para caber nos limites orçamentais da Comissão Europeia e nas expectativas de rating das agências financeiras.

O panorama político revelado por esta campanha confirma uma tendência preocupante: a estabilidade tornou-se um fetiche discursivo que esvazia o debate democrático. Os partidos do ‘centrão’ reclamam a capacidade de “governar sem sobressaltos”, embora tenham precipitado as quedas de dois governos num espaço de dois anos! Mas recusam tocar nos mecanismos que estão na raiz da instabilidade vivida pela maioria da população: baixos salários, precariedade laboral, crise habitacional, serviços públicos degradados e vulnerabilidade ambiental crescente. Aquela ideia de estabilidade — enquanto “boa gestão” e “responsabilidade fiscal” — é usada para justificar o adiamento crónico de reformas estruturantes, e, mais grave ainda, para deslegitimar propostas alternativas mais transformadoras, rotuladas como radicais ou irresponsáveis. A repetição de fórmulas económicas ineficazes revela um sistema político que, embora formalmente democrático, funciona em larga medida como gestor de um modelo económico falido, sem capacidade real de planear o futuro. A única estabilidade que se vislumbra parece pois reduzir-se à permanência no poder das forças políticas que se alternam na gestão do país com as mesmas receitas requentadas; pelo menos a julgar pelas sucessivas sondagens - que envenenam a liberdade de escolha, favorecendo o erradamente o chamado “voto útil”, que de útil nada tem…

O conjunto de frases, de um artigo de opinião de Carlos Marques de Almeida, citado no início do post, resume alguns dos aspectos que aqui analisei. O “exame” refere-se não apenas a uma gestão técnica dos problemas do dia-a-dia, mas a uma prova mais profunda de capacidade de antecipar riscos, redistribuir recursos e construir sentido coletivo — sobretudo em tempos de crise. A política falhou não porque não haja governos, leis ou eleições, mas porque se tornou cada vez mais gestão de curto prazo, submetida a imperativos externos (mercados, Bruxelas, agências de rating) e a ciclos eleitorais cada vez mais curtos e mais defensivos. Condensa também uma crítica subtil, mas necessária, ao próprio processo democrático em contexto de despolitização. Os eleitores são levados a votar não porque acreditem num futuro colectivo, mas para procurar algum simulacro de ordem ou sossego, muitas vezes dentro de um leque de opções que já não representam visões estruturantes alternativas. É um voto que tende mais a reduzir danos do que a projetar mudanças. A estabilidade que se procura nas urnas é, muitas vezes, uma defesa contra o medo, não uma aposta num horizonte comum. O problema não é a ausência de discursos sobre estabilidade, mas a sua vacuidade estratégica. PS, PSD, IL, e até mesmo sectores à esquerda, apresentam-se como garantias de estabilidade — seja ela fiscal, governativa ou institucional —, mas ao recusarem repensar o modelo económico, o papel do Estado, a transição ecológica, o lugar de Portugal na Europa ou os mecanismos de participação democrática, contribuem activamente para o agravamento da instabilidade real. Ao abdicar de pensar politicamente o país, isto é, de o reimaginar em função das suas necessidades, potencialidades e limites, os partidos tornam-se meros gestores do inevitável. E a instabilidade resulta precisamente desse vazio: os problemas acumulam-se, os cidadãos desconfiam, o sistema endurece e, por fim, fractura. E depois vêm queixar-se do aumento da abstenção e dos avanços da extrema-direita populista…

O apagão de Abril mostrou que bastam minutos para revelar décadas de omissões e de gestão economicista. A campanha de Maio evidencia que os partidos do arco governativo continuam a tratar a crise social e a emergência ecológica como notas de rodapé. Persistir nesta rota é navegar com instrumentos desadequados: sem bússola moral, nem mapa de longo prazo. Este estado de coisas revela uma falência da política enquanto horizonte de transformação, que requer ousadia e coragem. E é também um alerta: a estabilidade de fachada é uma das formas mais perigosas de instabilidade futura, porque adia decisões, esvazia o debate e enfraquece o contrato social. A verdadeira estabilidade não é a ausência de perturbações, mas a construção colectiva de uma sociedade resiliente, justa e ecologicamente viável. Sem essa visão transformadora, repetiremos eleições, escândalos e colapsos – até que a democracia perca por completo a sua força mobilizadora. Se os partidos se demitem de pensar, os cidadãos ficam reduzidos a escolher entre versões quase idênticas do mesmo impasse. O desafio que temos pela frente não é restaurar uma estabilidade perdida – é reinventar uma ousadia transformadora, com coragem, imaginação e sentido de justiça. E isso exigiria uma política que voltasse a ser digna desse nome.

Retomar a escrita: acompanhando um mundo moribundo

O fim do mundo tal como o conhecemos é o fim de um mundo que necessita de cuidados paliativos e talvez, através desses cuidados, a humanidade possa aprender a ser ensinada pela violência que infligiu a si própria e ao resto da natureza(“The end of the world as we know it is the end of a world that needs hospicing and perhaps, through this hospicing, humanity can learn to be taught by the violence it has inflicted on itself and the rest of nature.”) Vanessa Machado de Oliveira

Quebrando um silêncio de vários meses, retomo a escrita para tentar desfiar algumas das tramas que vão tecendo o mundo à minha/nossa volta, em que tenciono revisitar inevitavelmente temas que atravessaram os posts que publiquei durante 2024 – guerra(s), crise ambiental, crise política, crise social. O Respigador continua atento e sem mãos a medir, mas não tem conseguido trazer à escrita tudo aquilo que tem respigado.

Há umas semanas atrás e perante notícias recentes, escrevi num email a uma pessoa amiga: “O mundo continua o seu caminho tresloucado, com os ventos de guerra anunciada a soprarem com força crescente. Navegar esta tempestade não é fácil e a aparente apatia da sociedade civil torna a situação ainda mais chocante e trágica...”. Constato que atingimos, colectivamente, um grau de disfuncionalidade que é disfarçado todos os dias pelos sinais de aparente ‘normalidade’ e, principalmente, pelas narrativas trazidas pela grande maioria dos media, focados na sua missão de cobrir os acontecimentos que ‘marcam a actualidade’ e que são concatenados numa sequência frenética, sem que lhes seja dada a contextualização ou a profundidade necessárias a um entendimento do nexo que os liga ou das suas causas profundas. Por exemplo, tomando como ponto de partida o tema do belicismo reinante, constato que o abandono declarado da diplomacia e da convivência pacífica em favor da militarização e da guerra tem vindo a ofuscar o agravamento da calamidade ambiental (que não é apenas climática!), que, por sua vez, decorre da prossecução de um modelo económico depredador a nível mundial, modelo esse que promove modos de vida insustentáveis por uma parte substancial da população, deixando um outra parte em modo de sobrevivência e enriquecendo obscenamente uma pequeníssima minoria… Estes são alguns dos nexos que se perdem na voragem de um quotidiano que deixa pouco tempo ou energia para os digerir e atravessar.

Ao normalizar este estado de coisas arriscamo-nos a tomá-lo como uma consequência inevitável de algo que nos transcende e a aceitar os seus impactos negativos como efeito colateral de um modelo de sociedade imperfeito e ‘complicado’ mas que, apesar de tudo, nos proporciona (algum) bem-estar e conforto (para quem os tem). A outra desculpa com que muitos se defendem vem de um lugar de impotência – as decisões são tomadas num nível ao qual o cidadão comum não tem acesso nem capacidade de influência ou de agência. Acresce que muitos daqueles que alegam ‘descomplicar’ ou trazer algum entendimento carregam consigo vieses ou agendas dissimuladas que podem ser difíceis de descortinar e de desconstruir por exigirem trabalho e tempo de pesquisa – que muita gente não tem.

Como escrevi no início de 2023 (aqui), estamos a viver uma permacrise em que acontecimentos de diversa natureza – geopolíticos, ambientais, sociais, económicos – e de alcance igualmente diverso, mas eminentemente interligados, se sucedem vertiginosamente deixando-nos perplexos, confusos, zangados, amedrontados ou desanimados e com pouca capacidade de reflectir ou de reagir. Lamentavelmente, este estado de espírito é favorável à manutenção do status quo da minoria, que teria muito a perder se a versão de mundo que se esforçam por manter se desfizesse. Trata-se em parte de um modelo socioeconómico ecologicamente destrutivo e socialmente injusto, mas trata-se em igual medida de uma visão de mundo distorcida que valoriza o materialismo, o utilitarismo, o excepcionalismo humano e uma noção redutora de progresso – que podíamos chamar de Modernidade (ocidental).

Escrevi anteriormente sobre alguns dos pilares da Modernidade: aqui, aqui e aqui. Desconfio que se as prioridades das sociedades contemporâneas, ditadas pelos paradigmas dominantes, não fossem o crescimento económico, a acumulação de capital (material e imaterial, p.ex. dinheiro) e a dominação do mundo não humano, mas antes o autoconhecimento, a solidariedade e o bem comum, teríamos um prognóstico bem menos negro do que aquele que enfrentamos.


Estes temas atravessam um livro com o qual me cruzei recentemente e que invoco aqui para ajudar a pensar o estado do mundo e como enfrentá-lo, ou antes, como acompanhá-lo e deixar que ele nos acompanhe. Trata-se de Hospicing Modernity (2021) da autora de origem brasileira e docente na University of Victoria* (Canadá), Vanessa Machado de Oliveira (aka Vanessa Andreotti). É possível aceder a excertos do livro aqui.

O livro é um convite à nossa capacidade de confrontar o desconforto de reconhecer a nossa própria cumplicidade, as nossas contradições e medos em relação à Modernidade, sem recorrer à atitude defensiva ou à apatia. O título dá desde logo uma pista poderosa: “hospedar a Modernidade” é acompanhá-la no seu fim — como se faz com um doente terminal — com cuidado, com compaixão, mas também com lucidez sobre a sua condição. A autora não propõe uma reforma da Modernidade, mas uma transição com ela e para além dela. ‘Hospedar a Modernidade’ será então reconhecer os seus limites e esgotamentos. Vanessa descreve a Modernidade como um sistema que promete controlo, progresso, segurança e soluções para todos os problemas — mas que, ao mesmo tempo, produz desigualdade, violência epistémica, destruição ambiental e esgotamento existencial. Ao adoptar a máxima “Não podemos resolver a crise com as mesmas ferramentas que a criaram”, ela propõe um tipo diferente de aprendizagem, não para “melhorar o sistema”, mas para nos desapegarmos dele — com cuidado e responsabilidade. A autora defende que, antes de aprender coisas novas, é preciso desaprender certos pressupostos: o individualismo, a obsessão com o progresso linear, a separação entre humanos e natureza, a ideia de que há soluções técnicas para problemas relacionais e espirituais. O processo educativo torna-se, então, mais um “acompanhar processos de transição interior e colectiva” do que “ensinar conteúdos”. No livro, ela apresenta quatro metáforas para as formas como as pessoas (ou coletivos) se posicionam diante de um futuro que envolverá um muito provável colapso civilizacional: o Guerreiro – quer vencer o sistema com as suas próprias armas; o Banqueiro – acumula soluções, saberes e práticas alternativas como se fossem capital; o Bombeiro – tenta apagar incêndios o tempo todo, mas sem questionar as causas profundas; o Cuidador de Hospício (Hospice Worker) – aceita que estamos num fim de ciclo e cuida das relações, dos afectos, dos lutos, preparando o terreno para o que poderá emergir. É este último que ela propõe como caminho: uma aprendizagem que saiba lidar com perdas, com incertezas, com a morte de velhas formas de estar no mundo.

Uma outra proposta importante do livro é a decolonização (palavra que se pretende distinguir de descolonização, que descreve o processo histórico de autodeterminação de povos subjugados por regimes coloniais) da aprendizagem. Para Vanessa, a educação ocidental moderna carrega consigo um projeto colonial: define o que é conhecimento legítimo, quem tem autoridade para ensinar, quais futuros são possíveis ou desejáveis. Decolonizar a aprendizagem é abrir espaço para outras cosmologias, outros modos de relação com o mundo, com o tempo, com o saber. Mas isso não se faz com uma simples “inclusão” de saberes indígenas ou afro-diaspóricos no currículo — requer uma transformação profunda nas formas de estar, sentir, decidir e agir. Vanessa convida a deixar morrer com dignidade certas ideias e estruturas, para que algo novo possa eventualmente nascer. Ela desafia-nos a pensar as aprendizagens não apenas como instrumentos de transformação social, mas como práticas de cuidado em tempos de fim — de fim de uma era, de um paradigma, talvez de uma forma de mundo.

Ficam estas pistas para aguçar o apetite para aquele livro, mas também para a sua sequela (Outgrowing Modernity) que será publicada este Verão. Deixo ainda ligações para alguns vídeos onde a autora discorre, em diálogo, sobre os temas do seu livro: conversa com Nate Hagens (aqui) e conversa colectiva (The Great Simplification): https://youtu.be/MDtn0eEas7c (1h48); conversa com Nora Bateson (Faculty of Education at the University of Victoria): https://youtu.be/8VIkI9v4kVg (1h30); conversa com N.S. Lupson (Entangled World): https://youtu.be/TXbV1Rj924Q (1h05).


* Nota: Na 1ª versão deste post tinha indicado por lapso que se tratava da University of British Columbia - ver aqui.